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quarta-feira, fevereiro 08, 2006

Nunca é tarde...

Um dia estava buscando algumas informações para minha pesquisa sobre o Violino, e olhando daqui e dali, achei essa história real, e fiquei tocada com a experiência dessa mulher, e me dei conta que pensava:
" Será que é tarde demais pra aprender a tocar violino?"
E depois dessa história eu mudei meus conceitos, e estou aprendendo e desvendando este instrumento, que tem uma maneira particular de ser tocado por cada pessoa.
Pra mim, ele é a poesia sem palavras.
História de um violino

Tenho observado mais detidamente as pessoas de uns tempos para cá, imaginando o que elas guardam como secretos encantamentos ou desejos fundos e explico por quê: é que arranquei, há pouco, um deles da mais abissal profundeza de minha história humana e quase ninguém acredita quando conto.Esta história começa assim: comecei a aprender piano quando era menina, mas fugia à fúria de minha professora e, aos poucos, abandonei o teclado; depois, comecei a aprender violão porque gostava muito de cantar. Ainda toco violão. E gosto. Mas, já tão tarde na vida, em tempo que as pessoas recolhem-se a silêncios e circunstâncias, vendo um violinista tocar, (re)descobri que meu mais secreto desejo fora sempre o de tocar violino. Então, tomada de um grande desejo de não morrer tão cedo, fui a uma loja de instrumentos musicais comprar um pedestal de microfone para meu filho Paulo, que tem 14 anos e toca guitarra como ninguém. No fundo, bem... no fundo tinha ido espiar os violinos; mas os deuses tinham me reservado uma surpresa...Alguém afinava ali, de costas para mim, um violino. Por trinta segundos talvez, vi o arco que subia e descia, a música tomou-me toda e meus olhos se encheram de lágrimas. Disfarcei, perguntei quanto era o pedestal, fiz o cheque: estava eu chorando pela primeira vez por minha chance, meu desejo secreto, minha vontade guardada a sete chaves...Fui até a porta e voltei: a escola aqui do lado ainda tem o curso de violino? O homem que afinava há pouco o instrumento me disse que não sabia, e procurou entre centenas de papéis na gaveta um cartão. E me estendeu: este professor ensina violino muito bem, procure-o . Li lá os nomes “Siméia e Gustavo” . À noite, criei coragem e liguei. Falei com ela, o professor cheio de horários, era sexta-feira e aceitou ver-me no dia seguinte às 8 horas. Fui, e , no caminho, quis várias vezes chorar. Chorei.Atendeu-me um rapaz sorridente que me estendeu a mão e me fez entrar: o professor de violino... me falou que nem sempre a gente se adapta ao instrumento, que pode gostar de ouvir, mas... e me perguntou se já tinha segurado um violino... Não, eu disse que não. Então, ele abriu a caixa e tirou de lá o meu sonho. E sem saber o que eu sonhava, pôs o violino entre as minhas mãos. E eu depositei o violino no meu colo, pela primeira vez em minha vida eu podia niná-lo. Tive vontade de apertá-lo contra o meu peito, mas me envergonhei.O professor me pôs em pé, meus olhos cheios de lágrimas e anunciei: se eu chorar... Um rio teimava em me tomar por dentro quando ele me ensinou a colocar o violino do lado esquerdo ( tinha que ser do lado esquerdo, onde batia descompassado meu coração...), como ficava o queixo. Tentei várias vezes sem a espaleira a me ajudar. E, então, pude segurar o arco: crina, parafuso, ponta, talão. E finalmente tocar o arco sobre as cordas, esta é o sol, esta é o ré, esta é o lá, esta é o mi. O breu para a crina, o cuidado com o arco... se cair no chão... o mi tem um som tão fino como um grito no fundo da alma da gente, sabia? Depois disse a ele que gostaria de comprar um violino, já, agora, hoje, é tão urgente... Ele telefonou para a loja, havia um , apenas um e fui buscar: o mesmo que eu vira, no dia anterior, sendo afinado... Coincidência?Paguei, e vim no carro, com o violino “sentado” ao meu lado, dentro da caixa. Era sábado no mundo e eu tinha um violino. Ah, não... um violino me tinha na manhã de Sábado... E me senti , pela primeira vez, dona do meu próprio destino, feliz. Em casa, mostrei-o a meu marido; abri a caixa e chorei: eis que o violino brilhava, era meu, de mais ninguém. Chorei o choro bom dos que encontraram, depois de tanto procurar, uma resposta. E , desde então, tenho estudado violino. Tenho alimentado o sonho de aprender um instrumento tão difícil aos cinquenta e tantos anos. Rio quando imagino meus netos me ouvindo tocar; rio de mim mesma e dos meus sonhos; comecei a aprender música pelas mãos de Siméia e sua infinita paciência: teoria musical é coisa lá que se aprenda ou reaprenda aos cinquenta e tantos?Se estou em casa, a caixa do violino fica aberta.Escrevo, leio e volta e meia vou lá, me entregar ao violino. Nunca pesquisei tanto sobre um só assunto, nunca quis tanto que as terças-feiras chegassem , que me dessem a chance de fazer algo que a mim mesma eu nunca tinha confessado: o secreto desejo de tocar este instrumento antigo, cuja origem é a Idade Média, com suas quatro cordas mágicas e seu arco de fazer o mais suave e magnífico de todos os sons.Tenho a impressão de que Deus fala aos homens através de quatro cordas, de um arco... e me converti, me entreguei à possibilidade remota de tocar. Flor de gesta que sou, teimosa que sou, quem sabe um dia consigo? Já aprendi tantas coisas nesta vida louca demais. E incorporei na minha vida por esses tempos palavras que nunca imaginei existirem: voluta, corpo, cavalete, estandarte, espelho, fundo, cravelhas queixeira, afinador.E estudo pacientemente enquanto espero que Deus fale comigo pelas cordas do meu violino. Por enquanto, fala tão desafinado para meus ouvidos e dedos e alma desafinada. Mas, quem sabe, lá longe, no tempo que dobra os anos, ele me permita ouvi-Lo numa manhã de Primavera, claro e nítido, alto e claro, quando eu olhar uma partitura e souber que, por ela, também falo a sublime linguagem dos anjos e das crianças?Agora, descubro encantada e atenta, descobri por que as crianças cantam em agudos como os violinos...
agora, descubro, encantada, por que tento, por que não desisti,
porque me reinvento, Amém.

Esther PS Rosado
A autora é professora de Literatura e Redação em curso pré-vestibular
( Sâo José dos Campos, SP).